Internacional
13:08

Reações mistas de soldados ucranianos ao plano de paz proposto pelos EUA

Soldados na linha de frente da Ucrânia apresentaram respostas variadas — de questionamento a irritação e resignação — à proposta de paz apresentada pelos Estados Unidos.

A BBC entrevistou cerca de seis soldados, que enviaram suas opiniões por redes sociais e e-mail, em reação ao plano original americano, cujos detalhes foram vazados na semana passada.

Desde então, autoridades americanas e ucranianas discutem mudanças na proposta e continuam conversações sobre a “estrutura da paz”.

Yaroslav, soldado do leste da Ucrânia, classificou o plano americano original como “péssimo” e disse que ninguém o apoiaria.

Um médico do Exército, com o codinome Shtutser, rejeitou a proposta como “absolutamente vergonhosa” e afirmou que não merece atenção.

Por outro lado, o soldado Snake declarou que “está na hora de concordarmos, pelo menos, em alguma coisa”.

O plano dos EUA foi apresentado num momento em que a Rússia avançou significativamente no campo de batalha, com a Ucrânia perdendo cerca de 450 km² só no último mês.

Kiev ainda mantém controle sobre cerca de 15% da região de Donbas, que compreende os oblasts de Luhansk e Donetsk e é um objetivo militar principal da Rússia.

No entanto, o plano original propõe que a Ucrânia ceda toda esta região, incluindo áreas defendidas com sucesso durante quase quatro anos.

Snake declarou: “Deixe que eles tomem”, e acrescentou que quase não restam pessoas vivendo nas cidades e vilarejos locais. “Estamos lutando pela terra, e não pelas pessoas, enquanto continuamos perdendo vidas.”

Andrii, oficial do Estado-maior, considerou a proposta difícil e dolorosa, mas indicou que a Ucrânia pode não ter outra escolha.

Desde 2014, com a anexação da Crimeia pela Rússia e a conquista de partes de Donbas por seus aliados, a Ucrânia vem defendendo esta região.

“Podemos não querer ceder a região, mas não temos recursos e força militar suficientes para mantê-la”, explicou Andrii.

O leste da Ucrânia tem sido palco dos combates mais intensos, com dezenas de milhares de soldados ucranianos mortos defendendo a região.

Matros, que luta desde 2018, afirmou que entregar Donbas significaria anular todos os esforços das forças armadas e desconsiderar vidas de militares e civis mortos.

O plano também propõe reduzir o contingente das forças armadas da Ucrânia para 600 mil soldados, ainda que seja acima do efetivo antes da invasão, que tinha cerca de 250 mil soldados em tempo integral.

Atualmente, estimativas indicam que o número de soldados ativos ultrapassa 800 mil.

Snake acredita que muitos dos soldados atuais serão necessários para ajudar na reconstrução após a guerra, e questiona a utilidade de um grande exército diante da oferta de garantias de segurança.

Andrii concorda e afirma que, caso existam garantias eficazes, não há necessidade de manter um exército tão grande.

Ele também mencionou que a economia ucraniana não suportaria essa estrutura militar em tempos de paz.

Por sua vez, Shtutser avalia que o Exército é essencial para evitar a derrota e a escravidão.

Matros classifica como “absurda e manipuladora” a proposta de redução das forças militares.

O acordo dependerá das garantias de segurança futuras oferecidas à Ucrânia.

O plano descarta a entrada do país na Otan, mas não na União Europeia, e prevê garantias de segurança dos Estados Unidos se a Rússia atacar novamente, embora sem detalhar a extensão desse apoio.

Também afasta a presença de forças da Otan na Ucrânia em caso de acordo.

Yevhen, operador de drones no leste, valoriza a presença de tropas estrangeiras, apoiando o plano britânico de criar uma coalizão para garantir a segurança com tropas na Ucrânia.

Andrii, no entanto, considera que a Europa está dividida e teme que as esperanças estejam concentradas apenas nos Estados Unidos.

Alguns soldados, como Shtutser, duvidam das garantias americanas com o governo atual.

O plano prevê a realização de novas eleições em até 100 dias após o fim do conflito, apesar da Constituição ucraniana impedir eleições em tempo de guerra.

Frustrações crescentes com o governo atual são evidentes, principalmente devido a investigações sobre corrupção envolvendo contratos de energia no valor de US$ 100 milhões.

O presidente Volodymyr Zelensky já demitiu dois ministros que negam as acusações, enquanto outras figuras políticas também estão sob investigação.

Esses escândalos têm gerado conflitos internos e dominam as manchetes no país, sendo um tema importante em paralelo ao conflito.

Os soldados entrevistados apoiam a realização das eleições.

Snake afirmou que elas são necessárias, por não confiarem nos atuais governantes.

A soldada Marin também defende as eleições para combater a corrupção.

Andrii concorda com a necessidade de renovação do governo, mas não de imediato.

Apesar das controvérsias envolvendo o plano, as novas eleições parecem ser uma das propostas menos polêmicas.

No geral, há preocupações sérias em relação às outras propostas, com Yaroslav dizendo que o plano “não funcionará” e Oleksandr expressando rejeição de forma enfática.

Muitos soldados transmitem cansaço com a luta. Andrii expressou preocupação, mas finalizou que se o plano conseguir acabar com a guerra, será suficiente para ele.

Créditos: BBC

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