STF condena golpismo militar e desafia papel das Forças Armadas no Brasil
É inédita no Brasil a prisão de um ex-presidente da República junto com vários oficiais superiores das Forças Armadas, incluindo três generais, um almirante e diversos coronéis, majores e capitães, considerados culpados por conspirar contra a democracia.
Essa condenação foi feita pelo poder civil de forma clara e sem resistência corporativa até o momento, sinalizando que ataques à democracia podem agora ter penalidades severas.
No entanto, a efetividade dessa medida depende muito da postura do poder político, que tem se mostrado pouco atuante e assiste passivamente ao desenrolar dos fatos.
A sociedade tem demonstrado pouca disposição para defender a democracia nas ruas, com exceção das manifestações recentes de 21 de setembro, que mobilizaram partes do país como Rio de Janeiro e São Paulo.
O julgamento pelo STF não contou com grande apoio popular, apesar do seu valor histórico, num momento em que o presidencialismo e a estabilidade institucional são ameaçados pelo crescimento do poder do Congresso, cada vez mais conservador e dominado por interesses particulares, sem compromisso republicano.
A relevância da decisão do STF não está apenas nos líderes condenados — liderados por um ex-presidente e capitão do Exército —, mas também na tipificação do crime como tentativa de golpe contra a democracia, um crime político que deve ser punido rigorosamente e que deve servir de precedente para o sistema jurídico brasileiro.
Esse marco não é um fato isolado e deve ser cultivado como um avanço para o direito público no país.
Porém, a decisão destaca a eterna questão do papel das Forças Armadas na política nacional, que historicamente têm sido responsáveis por golpes, insurreições e regimes autoritários desde a República, mantendo uma tutela sobre o poder civil e naturalizando uma suposta superioridade moral e política.
Apesar das esperanças geradas, o desafio permanece, pois tradicionalmente golpistas no Brasil vinham impunes, sendo recompensados com promoções e poder, e continuaram atuando contra a democracia sem sofrer consequências.
Exemplos como a “República do Galeão” em 1954, as tentativas de impedir a posse de presidentes nas décadas de 1950 e 1960, e a participação direta no golpe militar de 1964, com apoio externo, demonstram essa impunidade e as consequências trágicas das intervenções militares, incluindo prisões, tortura e assassinatos.
Mesmo após o fim da ditadura, os militares influenciaram a transição e a elaboração da Constituição de 1988, deixando marcas como o artigo 142, que foi invocado em tentativas golpistas recentes.
Embora tenha havido um período de estabilidade democrática com eleições regulares, os ataques autoritários recentes demonstram que o encontro entre golpismo e impunidade segue alimentando crises políticas graves.
O desafio atual não é apenas punir alguns oficiais envolvidos, mas discutir e confrontar o papel coletivo das Forças Armadas, cujo intervencionismo histórico na política permanece um entrave à democracia.
A sociedade e os políticos precisam decidir que Forças Armadas desejam, rompendo com a tradição autoritária e a visão dos militares como moderadores supremos do país.
Para avançar, é fundamental formar uma nova maioria social capaz de se organizar, mobilizar e defender um projeto de país democrático e inclusivo, mesmo reconhecendo que o governo atual é a alternativa viável diante das condições políticas e dos desafios que enfrenta.
O STF deu um passo importante, mas ainda é o início de uma jornada que exige coragem e engajamento para assegurar que essa decisão retenha seu impacto e promova mudanças estruturais reais na relação entre militares e sociedade.
No contexto histórico, percebe-se que interesses das elites continuam a influenciar a política no Brasil, resistindo a mudanças sociais, e promovendo medidas legislativas e econômicas que desfavorecem a população e a democracia.
O futuro requer superar a vassalagem ideológica e os compromissos obscuros para construir um país mais justo e democrático, aprendendo com os erros do passado e enfrentando de frente o legado do autoritarismo militar.
Créditos: CartaCapital