Análise do encontro Lula-Trump e seus impactos na diplomacia brasileira
PhD especialista em Estados Unidos, professora da FAAP, pesquisadora do CEBRI e do Wilson Center, é referência brasileira na área de Relações Internacionais.
O encontro entre Luiz Inácio Lula da Silva e Donald Trump, agendado para ocorrer durante a cúpula da ASEAN em Kuala Lumpur, representa mais do que uma simples reunião bilateral; é um indicativo da nova dinâmica diplomática que o Brasil precisará manejar diante de uma Washington marcada pela lógica imprevisível da era Trump.
A escolha da Malásia como local neutro tem significado expressivo. Num contexto de crescente competição global, realizar o diálogo fora dos centros tradicionais de poder — nem em Washington, nem em Brasília — indica a tentativa de ambos os países de reposicionar suas relações num ambiente menos tenso.
Contudo, ao ocorrer dentro de um ambiente multilateral, com atenção regional e pressões internas em cada país, espera-se que o resultado seja moderado e cuidadosamente equilibrado.
Do lado brasileiro, a pauta está clara: busca-se a suspensão ou redução das tarifas que afetam produtos nacionais, a ampliação de exceções especialmente para café e carne, além da reabertura de canais de cooperação.
O Brasil procura demonstrar boa vontade oferecendo previsibilidade regulatória no setor digital, abertura na área de energia limpa e parceria na exploração de terras raras, mas sem abdicar da autonomia estratégica nem comprometer a aliança sino-brasileira, crucial para o agronegócio e a pauta exportadora.
Por sua vez, Washington deseja manter a pressão tarifária como instrumento negocial, buscando contrapartidas rápidas como a flexibilização da tarifa brasileira ao etanol de milho dos EUA, estabilidade regulatória para as Big Techs e algum controle sobre o avanço chinês em setores sensíveis.
A discussão tem caráter mais pragmático do que ideológico, e o estilo de Trump traz uma dimensão distinta de teatralidade, na qual gestos simbólicos como um aperto de mão e promessas de um “bom acordo em breve” podem ser mais influentes do que documentos técnicos.
Apesar disso, não se deve tirar conclusões precipitadas. O diálogo em Kuala Lumpur indica uma tendência à distensão entre Brasília e Washington.
Desde o restabelecimento dos contatos de alto nível, há sinais de convergência tática e vontade de diminuir a tensão. Porém, é necessário cautela.
As características da política externa sob Trump permanecem intactas: imprevisibilidade, posições voláteis e uma abordagem transacional às parcerias. Em suma, o vínculo pessoal e a disposição do parceiro em “oferecer algo” têm maior importância do que compromissos institucionais ou consistência a longo prazo.
Essa lógica pode gerar momentos de aproximação, mas também riscos de reviravoltas abruptas.
O Brasil deve continuar cultivando o diálogo e explorando oportunidades, desde que o faça com prudência. Confiar em promessas sem garantias seria ingênuo, enquanto recusar o diálogo representaria desperdício de uma relação baseada em interesses comuns.
Entre gestos e garantias, o mais importante é que o país mantenha uma política externa capaz de transformar cada oportunidade tática em ganhos estruturais.
Em resumo, o clima indica um abrandamento da crise anterior, mas a estratégia deve ser de vigilância constante. O pragmatismo do Brasil precisa ser combinado com ceticismo construtivo, que é o único meio eficaz contra as oscilações de uma Casa Branca guiada por instinto e improvisação.
Créditos: CNN Brasil