Hamas realiza execuções públicas e enfrenta facções rivais após saída do Exército de Israel em Gaza
Após a retirada do Exército de Israel, o Hamas movimenta-se para restabelecer seu controle na Faixa de Gaza, confrontando grupos rivais e promovendo execuções públicas. A população local demonstra opiniões divididas quanto ao retorno do grupo ao poder, em meio a um cenário que completa dois anos de conflito.
Israel condiciona a continuidade da ajuda à devolução dos corpos de reféns, enquanto o plano de paz proposto pelo ex-presidente Donald Trump sugere a formação de um governo tecnocrático em Gaza, ideia ainda cercada de dúvidas.
O cessar-fogo da primeira fase do acordo entre Israel e Hamas permitiu ao grupo palestino tentar retomar a administração territorial da região mergulhada no caos da guerra. Desde a assinatura do acordo, o Hamas entrou em conflito com outras facções no enclave e realizou execuções públicas propagadas em vídeos nas redes sociais, mostrando uma disputa de poder que provoca divisões na população sobre a restauração da autoridade local.
O Hamas lançou uma operação para ocupar as áreas deixadas pelo Exército israelense após o acordo preliminar, alegando a necessidade de garantir a ordem e restabelecer a lei. Com poder em Gaza desde 2007, o grupo anunciou uma mobilização de 7 mil combatentes. Membros das Brigadas Izzedine al-Qassam, o braço armado do Hamas, foram vistos controlando multidões na entrega dos reféns, e a polícia local intensificou patrulhas armadas nas ruas.
Segundo fonte de segurança palestina em Gaza ouvida pela AFP, uma unidade recém-criada do Hamas, chamada Força de Dissuasão, está conduzindo operações para assegurar segurança e estabilidade. Desde o início da missão, ocorreram confrontos entre Hamas e outras facções.
Um desses embates se deu no distrito de Shejaiya, leste da Cidade de Gaza, local onde militares israelenses admitiram ter disparado após homens armados se aproximarem da zona recuperada pelas tropas. O Exército mantém controle sobre 53% do território palestino, porém não está claro se houve apoio a alguma facção nesse confronto. O conflito resultou em pelo menos quatro mortos, conforme fontes locais.
Nos últimos dias, os conflitos seguiram frequentes. No fim de semana, houve uma troca de tiros entre Hamas e o clã Dughmush, uma influente organização familiar, que deixou mais de 20 mortos. Vídeos divulgados confirmaram execuções públicas por homens encapuzados em praça, com apoio da rede TV al-Aqsa afirmando que os executados seriam criminosos ou suspeitos de espionagem a favor de Israel.
Histórico de desavenças entre o Hamas e outros grupos armados no território palestino é antigo, remontando à tomada violenta do poder pelo Hamas em 2007, que expulsou o Fatah e causou cerca de 120 mortes, segundo o Comitê Internacional da Cruz Vermelha.
Além do Hamas, outras forças atuam em Gaza, como a Jihad Islâmica, que colaborou no atentado contra Israel em 7 de outubro de 2023, e clãs familiares apoiados por Tel Aviv para enfrentar o Hamas. O governo israelense reconheceu em junho de 2025 o armamento desses grupos, com o primeiro-ministro Netanyahu chegando a defender publicamente a ação.
O grupo beneficiado, conhecido como Força Popular e liderado por Yasser Abu Shabab, tem atuação confirmada no sul da Faixa de Gaza, na região de Rafah, perto das fronteiras com Israel e Egito.
Embora o Hamas apresente a operação como combate ao crime motivado pelo caos social gerado pela guerra e invasão israelense, a população está dividida quanto ao uso da força para retomar o controle.
O advogado Mumen al-Natoor, de Gaza, condena as execuções sumárias e afirma que a violência sem julgamento é ilegal, caracterizando-os como criminosos e um capítulo sombrio da história local.
Já o ativista Ibrahim Faris classifica os conflitos internos como um erro e uma violação do direito ao processo justo.
Em outras áreas, a chegada do Hamas é vista positivamente, associada à retomada da normalidade após anos de crise, com relatos de organização do trânsito, reabertura de mercados e sensação de segurança contra criminosos.
Moradores como Abu Fadi al Banna e Hamdiya Shammiya destacam uma melhora na ordem e segurança proporcionada pelas patrulhas do Hamas.
Por outro lado, vozes como a de Hanya, palestina residente em Deir al-Balah, ressaltam a existência de um vácuo de poder, que não pode ser solucionado apenas pelo cessar-fogo, e apontam a necessidade de uma autoridade que imponha o Estado de Direito, mesmo rejeitando a volta do Hamas ao controle pleno.
O plano do ex-presidente Trump para Gaza inclui a criação de um governo palestino tecnocrático, sob supervisão internacional e presidência americana, além da implantação de uma Força de Estabilização internacional para garantir segurança e treinar forças locais. Contudo, esse plano carece de cronograma e enfrenta incertezas quanto às negociações futuras.
Créditos: O Globo