PF encontra provas de gravações feitas por Sergio Moro com delatores no Paraná
A Polícia Federal descobriu durante uma busca e apreensão na 13ª Vara Federal de Curitiba documentos que comprovam que o ex-juiz Sergio Moro grampeou autoridades com foro privilegiado usando delatores no Paraná.
A coluna teve acesso à gravação completa de 40 minutos do presidente do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR), Heinz Herwig, e ao despacho judicial que confirmam a ordem para monitoramento.
Em um documento de julho de 2005, Moro orienta o colaborador Tony Garcia a tentar gravar novamente a autoridade, alegando que as gravações anteriores não eram satisfatórias para os objetivos pretendidos.
O material apreendido, que inclui relatórios de inteligência, estava guardado na Vara e conta com transcrições de escutas envolvendo desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) e políticos com foro privilegiado. Isso reforça as acusações de que Moro usava delatores para monitorar autoridades além de sua competência legal.
Assim como os desembargadores, o presidente do TCE-PR só poderia ser investigado com autorização do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
A gravação do presidente do Tribunal ocorreu em fevereiro de 2005, e cinco meses depois Moro ordenou formalmente que o delator repetisse a tentativa de escuta.
Além disso, a PF apreendeu registros de gravações envolvendo desembargadores do TRF-4 feitas por outro colaborador, o advogado Sérgio Costa, que também tinham prerrogativa legal para investigação apenas por decisão do STJ.
A busca e apreensão na 13ª Vara Federal de Curitiba foi autorizada pelo ministro Dias Toffoli após vários pedidos do Supremo Tribunal Federal (STF) por documentos, fitas e gravações que não foram entregues mesmo depois da saída de Moro da magistratura.
Toffoli investiga denúncias de que delatores foram usados para monitorar autoridades fora da competência do juiz, com objetivo de pressioná-las. O processo corre sob sigilo.
Moro nega as acusações, considerando-as baseadas em relatos fantasiosos de criminosos condenados.
O ex-deputado Tony Garcia, que fez delação premiada com Moro há 21 anos após cerca de 30 dias preso, foi o primeiro a levar tais queixas ao STF.
Entre 2004 e 2005, ele atuou por ordem de Moro realizando gravações telefônicas e ambientais, inclusive com câmeras ocultas em seu escritório. Um policial federal chegou a acompanhar as atividades como secretário.
Relatórios de inteligência eram enviados periodicamente a Moro, mas parte importante desse material nunca foi anexada aos autos.
Essa omissão foi apontada por Garcia ao STF e confirmada pela PF, que encontrou documentos e mídias guardados na primeira busca realizada na Vara.
Os relatórios mencionam desembargadores do TRF-4 em momentos de foro íntimo, muitas vezes com medo de terem sido gravados.
As referências aparecem de forma genérica, como títulos de arquivos; um deles cita um magistrado com receio de que gravações de festas fossem vazadas.
Em relação ao presidente do TCE-PR, havia registros sumários da gravação enviados ao STF, mas o áudio completo nunca havia sido divulgado.
Esse material permaneceu guardado na 13ª Vara, cenário que permitiu a Moro classificá-lo publicamente como fantasioso.
A coluna teve acesso à transcrição completa da gravação, com cerca de 40 minutos e aproximadamente 20 páginas. Nela, o delator e o presidente do TCE criticam a atuação de Moro.
“Na verdade, ele é polícia, é promotor e é juiz”, afirma Heinz Herwig. Em outro momento, Tony Garcia reclama do método do magistrado: “Tudo o que você fala ele diz que é mentira. Quem cair na mão desse cara está ferrado”.
A investigação sobre Heinz consta no acordo de delação de Tony Garcia assinado por Moro, que determina apurar o possível envolvimento do presidente do TCE com uma grande empresa do setor alimentício, atualmente falida.
“O beneficiário se compromete a testemunhar e trazer prova documental”, registra o acordo.
Na gravação, esse tema surge de forma lateral e é tratado com desdém por Heinz. O foco da conversa é a pressão da Justiça. Tony relata sua prisão e a busca em sua casa. “Eles estão querendo aparecer”, diz Heinz.
“Querem fazer negócio”, responde o delator. “Agora, quem corre risco? Corro risco eu, corre risco você.” Heinz concorda: “Eu, claro”.
Ao longo da conversa, autoridades com foro privilegiado são mencionadas, conteúdo que, por lei, deveria ter sido avaliado por tribunais superiores, o que não ocorreu.
Em despacho de julho de 2005, ao analisar os relatórios da PF, Moro escreveu:
“Considerando os termos do acordo, reputa este Juízo conveniente tentativas de reuniões, com escuta ambiental, com Roberto Bertholdo, Michel Saliba e novamente com Heinz, visto que as gravações até o momento são insatisfatórias para os fins pretendidos”.
Consultado, Moro afirmou por sua assessoria que a investigação no STF se baseia em “relatos fantasiosos do criminoso condenado Tony Garcia”.
Ele disse que a colaboração ocorreu entre 2004 e 2005 e informou não ter acesso aos autos atuais do inquérito, por isso não comentou o material.
Créditos: UOL